Friday, April 15, 2005

Delírios de um anormal.

O que é a normalidade?

Hã?

Leia rápido:

O que é anormalidade?

Lembro de, numa das várias escapadas da facul pro cinema, ter ido parar no único exemplar da baixada que trazia(ainda hoje, pelo que reza a lenda) filmes alternativos e, assim, ter visto o trailler impagável do filme cujo título emprestei pra este post. Mais uma produção do seu Zé Mojica. Foi tão marcante que lembro do trailler e não lembro do filme assistido. É, Zé do caixão teve um sério impacto no meu imaginário, tanto que ele aparece como barman em CHERCHEZ LA FEMME.

É aqui que faço uma pausa e explico a que venho, claro.

Zé, apesar de todas as limitações que os realistas transformariam numa boa base prum romance de tese e um par de jornalistas transformou na mais divertida biografia que li até hoje, é um puta gênio! O personagem principal de seu filme era submetido a hipnose pelo bom doutor Mojica e daí advinham as mais diversas barbaridades... ah, o por quê da hipnose? Parte do tratamento para que ele parasse de ver Zé do Caixão em seus pesadelos ou algo assim. O fato é que seu Mojica sacou que a imagem que criou pro seu personagem era forte o suficiente pra permitir metalinguagem e ele não se esquivou de seu uso, apesar de tudo. Zé é o Rod Serling brasileiro.

Aliás, enquanto tava escrevendo OGJ pus seu Rod num dos capítulos e depois mudei de idéia, quis substituir por seu Zé, dar uma cor mais local e tudo mais, mas a preguiça falou mais alto. E como você nunca vai ler essa história mesmo, não fez a menor diferença. Pelo menos me poupei o trabalho de reescrever algumas cenas e dormi do mesmo jeito no fim do dia.

No final das contas, isso aqui é tudo sobre o que é normal e o que é anormal, mais um subproduto de minha leitura de Oliver Sacks. O médico gringo é bom escritor e faz pensar. Em alguns momentos senti a propensão de anunciar um ou outro distúrbio de comportamento pra tentar descolar um tratamento "de grátis" com o sujeito, mas sejamos realistas, terminaria numa camisa de força batendo com a cabeça na parede num asilo qualquer da periferia... tá, já faço isso todo dia, de segunda 'a sexta indo ao trabalho secular. Bater com a cabeça aos sábados e domingos fica totalmente fora de cogitação, então.

Numa das várias subseções do livro, Sacks fala do excesso. Na primeira, é a falta. Lembrei do ARKHAM ASYLUM, do Morrison, porque em um momento da narrativa a médica responsável diz que o Coringa pode sofrer de supersanidade. O conceito me pegou tanto quanto a idéia do endorcismo e agora vejo que é tudo real, de verdade e acontece mesmo. Pessoas que são mais felizes com a doença mental do que eram, arrã, "normalmente", entram em definitivo na minha lista de interesse por conta da linha de pesquisa que tenho feito a respeito de percepções, diferenças entre mente e cérebro etc. Todos assuntos que me interessam e pelos quais nutro curiosidade crescente.

Daniel Ley, por exemplo, logo no começo de sua história sofre um ACV e se vê transportado a uma realidade que desconhece. O dano cerebral, em seu caso, funciona também como recurso narrativo. Aliás, uma das coisas que me interessaram em O HOMEM QUE CONFUNDIU... foi o caso de um idoso vítima da síndrome de Korsakov que, ao perceber a perda gradual de sua memória, passou a inventar novas identidades e fatos de sua história pessoal a fim de manter-se minimamente humano. Pense a respeito: todos precisamos dessa "narrativa interna" pra manter o senso de identidade e a noção de humanidade bem clara.

Outra paciente de neurossífilis descobriu que o efeito da doença deu um novo colorido 'a sua vida. Mais coisas a explorar.

O que é a normalidade?

Junte tudo.

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